Era uma cidade pequena. Olhando-se
do céu era uma pequena mancha no meio de suas áreas rurais e silvestres. Nela
uma rua ia e outra vinha. Mas a simplicidade do entorno tinha o seu contraste
na língua de seus habitantes. A língua era voraz e a maledicência campeava
solta. Era chuva ácida nas pequenas sementes que o falado tinha em si e que
germinariam em talentos se não fossem essas línguas. Chuva que vinha das nuvens
de inveja, do medo da competência e em alguns casos de questões históricas das famílias. Nos bancos dos botecos, nas esquinas, nos cantos dos empórios, nos
corredores dos comércios era um só mal falar dos outros. As pessoas se
encolhiam para não despertar nada que caísse na boca do povo.
Um dia o prefeito, havendo sentido na própria pele o efeito das maledicências e tendo olhado para si e ansiado pelo crescimento ético de todos, resolveu enviar à
câmara um projeto de lei criando um feriado municipal: o dia da Benedicência.
Nesse dia, por lei, as pessoas praticariam o falar bem. Barracas com pastel,
pinhão, quirera e cerveja se espalhariam pelas praças e pelos bairros. O preço?
A pessoa se apresentaria a uma comissão de cada centro e falaria bem de alguém.
Se a comissão notasse que o falar era autêntico e sincero a pessoa ganharia um
vale do que pedisse. Era entregar o vale na barraca. Cada cidadão ou cidadã
ficaria com o número do vale. Ao final do dia haveria o sorteio que dependendo
dos recursos poderia ser bicicleta, televisão, etc. As várias comissões seriam
formadas pelos edis da cidade uma vez que receberam votos de confiança dos
eleitores. O prefeito receberia cada cidadão que não acreditasse na justiça dos
edis.
Bem, falaram muito do
prefeito e de seu projeto. Criticaram. Postagens maldosas se espalharam nas
redes sociais. Mas a atitude dele foi clara, firme e marcou a todos. A lei foi
aprovada.
Com o tempo o aprendizado de
um dia no ano foi-se espalhando para os outros dias. As pessoas vendo que o
falar bem lhes dava prazer passaram a adotá-lo. E a situação se inverteu. As
pessoas passaram a ser solidárias e a compreender os seus vizinhos. Num dado
ano não foi mais necessário o feriado municipal e ele foi abolido.
a experiência humana